terça-feira, 13 de março de 2012

Flex bom mesmo vai ser flex com turbo


Muito já se disse sobre todas as mazelas do Pro-álcool e todo o dinheiro que o país desperdiçou com subsídios estatais para satisfazer os delírios de “Brasil potência” da ditadura militar – que incluíram, até, a grave crise de abastecimento de 1989. Tempos depois, com o fim do subsídio, o álcool etílico se tornou competitivo graças ao próprio mercado (como sempre deveria ter sido...), via melhorias na produção e aumento do preço do petróleo. Hoje, sem subsídio nenhum, o etanol tem custo atraente em boa parte do país, mesmo com o preço da gasolina e do diesel artificialmente baixos. Pois é, o preço dos derivados de petróleo é artificialmente segurado graças a – de novo! – decisões populistas que vão custar caro no futuro. (Não vou tratar do fato de a gasolina brasileira, além da baixíssima qualidade, estar entre as mais caras do mundo; o preço dela está “baixo” para os patamares brasileiros, bem entendido).

De qualquer maneira, o fato é que as fabricantes (por favor, jamais chame uma fabricante de “montadora”. Elas não juntam pecinhas de Lego...) de veículos oferecem quase 100% dos veículos feitos aqui a tecnologia “flex”, ou seja, a possibilidade de usar gasolina, etanol ou qualquer mistura dos dois. Assim, seja qual for a barbeiragem que o governo de plantão faça, o consumidor sempre tem a opção de escolher qual combustível quer (só por curiosidade, lembram do Siena Tetrafuel, que também rodava com gás natural e gasolina sem álcool anidro?...).

Isso se consegue, essencialmente, graças a sistemas de injeção eletrônica bastante evoluídos. Eles detectam o tipo de combustível que está alimentando o motor em centenas de medições por segundo e o fornecem em quantidades muito precisas para aquela demanda de potência, naquele instante e com o tanto de ar necessário.

Tecnicamente, porém, esses motores enfrentam um problema sério: a taxa de compressão é fixa, determinada pela própria estrutura física do motor. Não há eletrônica que dê jeito nisso. Além disso, um motor que fosse especificamente projetado para o etanol poderia ter taxas de compressão muito mais altas do que a suportadas pelos motores que também trabalham com gasolina (poderíamos estar em algo como 14:1 ou até 15:1). O motor flex, obrigado a ficar num meio termo entre os dois combustíveis, acaba sendo menos eficiente do que o motor específico para um só (algo em torno de 35%; os flex ficam por volta de 30%).

Existem projetos complicadíssimos de motores que alteram sua taxa de compressão para resolver isso: uns modificam, em pleno funcionamento, a estrutura do bloco; outros alteram a forma e o tamanho do cabeçote (o da imagem acima é o Omnivore, da Lotus. Veja um vídeo legal do funcionamento dele aqui: http://www.youtube.com/watch?v=fIG9pWldO8U ). Penso que são exercícios interessantíssimos de engenharia, mas o resultado final vai ser, inevitavelmente, caro e complicado – e talvez pouco confiável na mesma proporção. A solução, penso, se chama turbocompressor.

O famoso turbo usa a energia que seria desperdiçada pelos gases de escapamento para girar uma turbina (daí o nome), que “sopra” mais ar para o motor – resolvendo o velho problema do fornecimento de ar dos motores aspirados. Não é à toa que, com turbo, motores pequenos conseguem potências só alcançadas por motores muito maiores.

Essa vai ser, penso, a solução definitiva para a maior eficiência do motor flex – e finalmente permitir o melhor dos dois mundos para o consumidor. Detectada uma gasolina de baixa qualidade, a central eletrônica baixa bastante a pressão do turbo; com gasolina melhor, a pressão pode ser aumentada. A tecnologia para fazer isso é simples; o Golf GTi já dispunha dela há tempos – e era exatamente por conta da qualidade da gasolina que sua potência variava entre 180cv e 193cv.

Adaptar essa tecnologia para o etanol será razoavelmente fácil; o maior desafio vai ser produzir bicos injetores que suportem um “delta” tão largo (uma variação entre as quantidades de gasolina em marcha lenta até as quantidades extremas de etanol puro em aceleração máxima). Comparado ao desafio inicial do próprio flex, porém, esse vai ser moleza.

O flex turbo pode ser preparado para economia em carros populares; para potência em esportivos; ou para um misto dos dois, ou até, em carros mais caros, em opções selecionáveis pelo motorista entre um extremo e outro. Nos luxuosos e esportivos o turbo já é usado há muito tempo; com essa tecnologia se tornando cada vez mais popular, está mais do que na hora de termos um turbo, de fábrica, que aproveite as qualidades superiores do etanol. Quem tem turbo “mexido” entende bem dessas vantagens... Só falta a confiabilidade de fábrica!

Isso, claro, até os híbridos com turbinas não se tornarem a regra no mercado... Como este aqui: http://www.jaguar.com/gl/en/about_jaguar/project_c-x75/innovation ! A turbina, por não ter movimento reciprocante, apenas giratório, dura mais e tem eficiência muito maior do que os motores a pistão... E o “flex”, nesse caso, é bem mais radical: ela aceita gasolina, etanol, metanol, diesel, biodiesel, gás natural...