quarta-feira, 1 de abril de 2015

Impedimento, renuncia e o caos que o PT criou

Estamos vivendo os dias imediatamente após as históricas manifestações de 15/03/15; apesar do esforço de alguns para desqualificar tanto os números quanto os próprios participantes, já se tem certeza de que foram as maiores manifestações populares da história do Brasil. Diferentemente do que ocorreu em junho de 2013, aqui havia uma pauta bem clara: protesto contra o PT, protesto contra o governo Dilma, protesto contra seu projeto bolivariano (coitado de Simon Bolívar, que era um liberal – olha no quê foram transformar seu nome!...) de poder a qualquer custo, protesto contra o estelionato eleitoral. Em função disso, e das inúmeras informações desencontradas sobre os aspectos jurídicos do “impeachment” que têm circulado, creio que cabem alguns esclarecimentos sobre a situação e sobre a lei.
Em 2013, havia uma insatisfação difusa, mal articulada, mas nem por isso menos legítima. O estopim, como se sabe, foram manifestações iniciadas pelo “Movimento Passe Livre”, um grupo controlado pelos partidos subalternos ao PT (PSOL, PCB e, em especial, PSTU – ainda que, veja-se a ironia, informem em seu site “não somos filiados a nenhum partido ou instituição”) cujo objetivo declarado era enfraquecer o governo estadual de São Paulo. O movimento se espalhou pelo país todo, de maneira incontrolável, e toda tentativa partidária de pautá-lo teve repúdio instantâneo (há múltiplos vídeos no Youtube mostrando isso – alguns não muito polidos mas bastante ilustrativos, em especial aquele em que há uma eloqüente rima para a sigla “PSTU”). O povo, quando tratava dos famosos “20 centavos”, estava na verdade protestando contra o persistente aumento da inflação, bem como contra a crise econômica que, desde ali, começava a dar sinais de quão grande seria.
Temos então o “Petrolão”, já considerado não apenas o maior caso de corrupção da história brasileira, mas o maior do mundo. Tanto os números quanto a desfaçatez dos envolvidos são estarrecedores. A Sra. Dilma Rousseff, como é sabido, foi presidente do conselho de administração da Petrobrás por longo período, inclusive “no que se refere” às denúncias mais importantes, feitas pelos próprios empreiteiros denunciados.
A Lei das Sociedades Anônimas (Lei 6.404/75) é muito clara a respeito (art. 138): o Conselho é, ao lado da diretoria, o responsável direto por sua administração, além de ter o dever de fiscalizá-la (arts. 138, 139 e, especialmente, 142). Já o estatuto social da própria Petrobrás não deixa dúvidas: seu artigo 17 determina expressamente que “a Petrobrás será dirigida por um Conselho de Administração, com funções deliberativas, e uma Diretoria Executiva”. Pretender, portanto, que a atual presidentA não tenha responsabilidade em tudo que ocorreu na empresa sob sua administração, ou mesmo que ela não soubesse que 88 BIlhões de reais tenham sido roubados, é atentar não só contra a inteligência do brasileiro, mas também contrariar a letra expressa da lei e do estatuto da Petrobrás.
Já o impedimento (“impeachment”) é disciplinado pela Constituição Federal (arts. 85 e 86) e por lei específica sobre o assunto (Lei 1.079/50). Em ambas as normas, fica evidenciado que somente o ato praticado durante o exercício da presidência pode justificar o “impeachment”. Ora, mas permitir a continuidade do “Petrolão” e ainda manter Graça Foster no cargo não caracteriza a continuidade do ilícito?...
Essa é, basicamente, a tese defendida pelo Professor Ives Gandra em seu parecer (link: http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2015/02/1584267-ives-gandra-da-silva-martins-a-hipotese-de-culpa-para-o-impeachment.shtml ). Ali, o professor esclarece que houve crime de responsabilidade, já devidamente caracterizado, pelas hipóteses de culpa (negligência, imprudência, imperícia, omissão), independentemente de as investigações detectarem se houve ou não dolo. Diz ele: “como a própria presidente da República declarou que, se tivesse melhores informações, não teria aprovado o negócio de quase US$ 2 bilhões da refinaria de Pasadena (nos Estados Unidos), à evidência, restou demonstrada ou omissão, ou imperícia ou imprudência ou negligência, ao avaliar o negócio. E a insistência, no seu primeiro e segundo mandatos, em manter a mesma diretoria que levou à destruição da Petrobras está a demonstrar que a improbidade por culpa fica caracterizada, continuando de um mandato ao outro.”
A tese é polêmica e merece reflexão. O jurista Miguel Reale Jr., tão brilhante quanto insuspeito, discorda dela (veja aqui: http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,renuncia-ja-imp-,1646272). Mas, dado o desastre da administração petista e seu escancarado envolvimento com o “Petrolão”, sugere outra saída: a renúncia.
A esse imbróglio, trago dois acréscimos: se comprovadas as denúncias do Sr. Barusco, de que a campanha presidencial contou com mais de 200 milhões de reais de dinheiro de corrupção, o caso não será de “impeachment”, mas de cassação da candidatura. É o que determina o artigo 30-A, § 2º, da Lei 9.504/97: “comprovados captação ou gastos ilícitos de recursos, para fins eleitorais, será negado diploma ao candidato, ou cassado, se já houver sido outorgado.” Entenda-se que não se trata, aqui, de impedimento da presidente, mas cassação da própria candidatura – e, por ser da candidatura, o vice-presidente seria cassado também. É hipótese que permanece no horizonte.
Mais ainda: a Lei 9.096/95, que é a lei dos partidos políticos, prevê, em seu art. 28, as hipóteses em que a Justiça Eleitoral deve cancelar o registro civil e o estatuto dos partidos. É minha opinião que o PT já deveria estar sendo investigado há muito tempo pelas suas conexões tanto como subalterno do Foro de São Paulo (incisos I e II) quanto como chefe da organização escancaradamente paramilitar chamada MST (que confessa, orgulhoso, ter até recebido treinamento militar das FARC – inciso IV). Afora isso, porém, se comprovadas as aludidas denúncias do Sr. Barusco, dentre outras feitas na investigação do “Petrolão”, o caso será de cassação do registro do PT pela alínea III do citado artigo. Se “deixar de prestar contas” à Justiça Eleitoral já justifica a cassação, que se dirá de usar do poder para desviar mais de 200 milhões de reais para uso em campanha eleitoral?...
Não há como saber o resultado das investigações, nem se alguma das hipóteses acima vai encurtar o mandato da Sra. Rousseff. O máximo que eu arriscaria seria dizer que absolutamente não acredito na hipótese de renúncia, em que a Sra. Rousseff iria abrir mão do poder em prol do bem do país: o credo do PT é o poder pelo poder – e uma vez entendido isso, percebe-se qual absurdo é pretender que haja ali alguma preocupação com “o bem do país”.
Mas isso tudo é, apenas, o curto e médio prazos.
A longo prazo, a questão é outra. O que realmente merece atenção não é o destino do mandato da Sra. Rousseff; a questão é que a crise econômica atual, muito mais do que a política, pode ter como efeito didático a demonstração do que os liberais sempre defenderam: as idéias do PT levam inexoravelmente ao desastre.
Isso é o fundamental. Não adianta a Sra. Rousseff ser impedida, ou mesmo cassada, se a seguir o povo eleger alguém com ideário semelhante. Seria trocar o elenco mas manter o roteiro. Por mais honesto que fosse o PT (desculpem, eu sei o quanto isso soa risível!...), por melhores que fossem suas intenções, nada mudaria o fato: estamos numa profunda crise econômica por causa, exclusivamente, do ideário que o PT defende no campo econômico.
Espero que isso fique cada vez mais claro na mente do público em geral. Espero que o brasileiro médio finalmente entenda que o que “tirou milhões da miséria” não foi o governo Lula, foi a situação internacional (estouro no preço das commodities, demanda da China, altíssima liquidez). E, para quem duvida, não precisa acreditar em mim: basta comparar o quanto a pobreza foi reduzida no Brasil com o quanto ela foi reduzida no resto do mundo, em especial em países com economia semelhante à nossa, nesse mesmo período. Isso vai deixar evidente que a pobreza no Brasil caiu apesar do governo do PT e não “graças” a ele. Independentemente do que ocorra na política, teremos anos terríveis pela frente em âmbito econômico; e, se esse fato fundamental – o receituário econômico do PT como origem e causa da crise – for entendido e compreendido pela maioria do povo (e é o que parecem mostrar as pesquisas de opinião, com aprovação do governo atual na casa de um dígito), então iremos sair dessa crise não apenas mais fortes, mas mais sábios para evitar que outra semelhante aconteça novamente.