quarta-feira, 1 de julho de 2009

Por que a Justiça é tão lerda? Parte 2

Publicado por Braghittoni Ives em 16 Fev 2009 sob: Direito (editar)

O segundo grande problema diretamente decorrente da legislação para a demora dos processos cíveis era (era, felizmente!) o efeito suspensivo dos embargos do devedor. As coisas funcionavam assim: alguém lhe dava um calote numa dívida, ou então lhe causava um prejuízo e não pagava.

Você, cidadão honesto, processava o sujeito (é agora que ele começa a exibir um sorriso de canto de lábio). Passava-se uns dois ou três anos esperando a sentença (aqui ele já está rindo de verdade); o juiz diz que você está certo, o fulano está errado e tem de pagar. Só que, como você já sabe, ele apela, e a apelação tem efeito suspensivo… Mesmo havendo uma sentença judicial dizendo que ele é que está errado, você é que fica sem o dinheiro, não ele. Lá se vão mais seis ou mais anos de espera (gargalhadas espasmódicas)… Bom, finalmente vem a decisão do tribunal (chamada “acórdão”). Agora, finalmente a coisa anda, certo?

Deve andar – afinal, existem outros recursos, mas graças a Santo Expedito esses, felizmente, não têm efeito suspensivo. Você pode enfim começar a execução da decisão!

É… Pois é, agora entra a pegadinha. Você começava a execução, mas o devedor movia OUTRA ação, chamada de “embargos do devedor”… Para discutir qualquer coisa na sua execução, por mais inútil e sem sentido que fosse… E – olhem que incrível! – tudo parava novamente!! Porque esses embargos do devedor também tinham efeito suspensivo, igualzinho à apelação… E começava tudo de novo. (Aqui, ele já não estava mais rindo da sua cara. Ele tinha coisas mais importantes para fazer, como gastar o SEU dinheiro).

Era difícil de explicar para os clientes. Ninguém acreditava numa coisa tão absurda. “Então, de que vale a decisão do juiz, que levou tanto tempo para ser dada? De nada?” Exato, de nada.
E para explicar isso para os professores estrangeiros, quando havia cursos de intercâmbio? Eles sempre achavam que era piada. O pior é que continuavam rindo depois que entendiam que não era piada…

Felizmente, isso acabou. Os embargos do devedor não têm mais efeito suspensivo – salvo situações excepcionais, decididas pelo juiz da execução, mediante caução e sem impedir vários dos atos constritivos, mas isso tudo é outra história. O fato é que a Lei 11.382/06 (veja a íntegra aqui: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11382.htm#art2) acabou com esse efeito dos embargos, dentre muitas outras alterações fundamentais (uma delas foi minha criação: a possibilidade do uso pela Justiça de leilões eletrônicos, conforme proposta que encaminhei ao Professor Athos Gusmão Carneiro e que foi encampada pelo artigo 689-A). O incrível é que o Código de Processo Civil é de 1973, e a lei em questão é de 2006. Ou seja, essa aberração processual de “efeito suspensivo” levou TRINTA E TRÊS ANOS para ser extirpada do nosso ordenamento. Isso sim é que é “justiça lenta”!!…

De quem é a culpa por isso? É sua. É minha. É de todo cidadão que não votou, somente, em candidatos ao legislativo federal que tivessem como plataforma de campanha mudar isso. É de todos nós que não exigimos, com faixas e passeatas na porta do Congresso, que todos os congressistas votassem pelo fim dessa norma, tivessem isso ou não nas suas promessas.

Pois é, democracia dá trabalho. Inclusive quando se trata dos mais insuspeitos problemas, como justiça lenta.

Semana que vem tratarei do princípio da oralidade.

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